COMÊNIO - O PAI DA DIDÁTICA
Comênio, pensador tcheco do século XVII, defendeu o ensino de “tudo para todos” e fundamentou um método para ensinar e aprender
"Didática significa arte de ensinar.” Este é o grande e solene
anúncio de Comênio na saudação que faz aos leitores em Didáctica Magna,
um tratado da arte universal de ensinar tudo a todos. Como um pensador
atento a seu tempo, reúne nesta obra sua proposta metodológica que as
escolas deveriam seguir no processo de ensino e de aprendizagem.
Trata-se de uma expressão e uma resposta aos desafios sociais e
educacionais do século XVII, em que se vivia a passagem da Idade Média
para a Idade Moderna. Tudo estava em processo de mudança. Surgiam
gradativamente uma nova forma de trabalho, a ciência, a filosofia, a
literatura e a educação; realizavam-se grandes viagens; novas terras
eram descobertas; tudo se universalizava. Tornava-se necessário que
todas essas conquistas sociais e científicas passassem a ser parte do
conhecimento escolar. Isso somente poderia acontecer se houvesse um
processo pedagógico-didático que fosse do mesmo tamanho dos novos
inventos universais humanos.
Comênio preocupou-se em apresentar os fundamentos sobre os quais se
pudesse edificar um método de ensinar e de aprender com tal segurança
que seria impossível não obter bons resultados. Esse método devia ter um
fundamento tão sólido que conduzisse, com certeza e sem erro, ao
progresso intelectual. As fontes principais desse método eram duas: a
natureza e a tipografia.
A natureza como modelo de ensino
Em Didáctica Magna, Comênio faz um paralelo entre as coisas naturais e
as coisas artificiais para apresentar sua nova arte de ensinar e
aprender. Sobre o fundamento da natureza, como modelo da arte de
ensinar, ele afirma: “Mas, como este fundamento não pode consistir senão
em conformar, com o máximo cuidado possível, as operações desta arte
com as normas que regulam as operações da natureza, [...] perscrutemos
os caminhos da natureza, servindo-nos do exemplo de uma ave que faz sair
dos ovos os seus filhos; e, observando como os jardineiros, os pintores
e os arquitetos seguem felizmente os vestígios da natureza, facilmente
veremos como é que eles devem também ser imitados pelos formadores da
juventude”.
O primeiro fundamento sobre o qual Comênio assenta seu novo modo de
ensinar é o da natureza perfeita. Os que seguirem os passos da natureza
produzirão obras igualmente perfeitas. O modelo adotado é a ave. Como
exemplo dos que seguem o proceder da ave ou da natureza encontram-se os
artesãos: carpinteiros, jardineiros, pintores etc.
Ao eleger a natureza como modelo de sua didática, Comênio expressava seu
tempo e a ele respondia pedagogicamente. Neste período, a ciência da
natureza apresentava um grande desenvolvimento. O homem começava a
passar do teocentrismo para o antropocentrismo, colocando o ser humano
como centro do universo. Ao conhecer a natureza, o homem podia mais
facilmente dominá-la, por isso se tornava senhor dela.
A concepção de natureza que está subjacente na obra de Comênio não é a
natureza em si mesma, mas o conhecimento científico que o homem adquiriu
sobre ela. Portanto, se os artesãos imitavam a natureza é porque haviam
observado e descoberto como ela agia. Por isso, podiam imitar-lhe os
passos em suas novas obras artificiais. Assim, ao tratar dos requisitos
gerais para ensinar e aprender, Comênio apresenta quatro passos:
1º. Mostra o fundamento, segundo o qual a natureza nada faz fora de seu
tempo. Para exemplificar, toma a ave como modelo. Ela, para multiplicar
sua raça, começa a trabalhar na primavera, quando o sol dá vida e vigor a
todos os seres.
2º. Aponta que o procedimento da natureza é imitado pelos artesãos, como
o jardineiro que aguarda a hora certa para o plantio das flores.
3º. Explicita o desrespeito à natureza por aqueles que não seguem seus
passos. Contrariando a natureza e os artesãos, que a imitam em suas
obras, existe a aberração da natureza: os professores. Esses não seguem o
modelo da ave, por isso os resultados de seu trabalho são, em sua
maioria, desastrosos para a aprendizagem. Entre as muitas aberrações
apontadas, apresentamos algumas: os professores não aproveitam o momento
favorável para exercitar as inteligências; não organizam
sequencialmente os exercícios; não se preocupam em preparar
antecipadamente todos os objetos de que necessitam para o ensino; querem
meter na cabeça dos alunos muitas coisas ao mesmo tempo; exigem que os
alunos decorem as lições sem tê-las compreendido; obrigam as crianças a
aprender pela força; constrangem as inteligências quando obrigam as
crianças a fazer coisas superiores à sua idade ou à sua capacidade.
4º. Apresenta a correção para cada uma das aberrações assinaladas,
mostrando como os professores devem imitar os artesãos, que, por sua
vez, imitam a natureza que é perfeita. É uma tríplice correção: que a
formação deve iniciar-se na primavera da vida, isto é, na puerícia; as
horas da manhã são mais propícias para os estudos; tudo deve dispor-se
segundo a idade, para que as crianças aprendam apenas aquilo que são
capazes de entender.
A tipografia como modelo de ensino
Se, num primeiro momento, Comênio elege a natureza, numa segunda fase o
centro de processo escolar passa a ser a imprensa. Assim se expressa:
“Desejamos que o método de ensinar atinja tal perfeição que, entre a
forma habitualmente usada até hoje e a nossa nova forma, apareça
claramente que vai a diferença que vemos entre a arte de multiplicar os
livros, copiando-os à pena, como era uso antigamente, e a arte da
imprensa, que depois foi descoberta e agora é usada”.
Como a arte tipográfica é mais adequada para escrever livros com
rapidez, precisão e elegância, assim também o novo método servirá para
ensinar a um maior número de alunos com maior proveito e prazer. Comênio
mostra todas as vantagens que a imprensa tem sobre a arte dos copistas,
a tal ponto que deseja até mudar o nome da didática para didacografia.
O pensador compara a arte da tipografia, quanto aos materiais que
utiliza e os trabalhos que são necessários para operar o novo invento,
com o novo método didático. Assim, na tipografia os materiais são:
papel, tipos, tinta, prelo; os trabalhos: preparação do papel,
composição, paginação, colocar tinta nos tipos, a tiragem das folhas
etc. Os procedimentos da tipografia e da nova didática são os mesmos:
“Na didacografia (agrada-me usar esta palavra), as coisas se passam
precisamente da mesma maneira. O papel são os alunos, em cujos espíritos
devem ser impressos os caracteres das ciências. Os tipos são os livros
didáticos e todos os outros instrumentos propositadamente preparados
para que, com a sua ajuda, as coisas a aprender se imprimam nas mentes
com pouca fadiga. A tinta é a viva-voz do professor que transfere o
significado das coisas, dos livros para as mentes dos alunos. O prelo é a
disciplina escolar que a todos dispõe e impele para se embeberem dos
ensinamentos”.
Comênio, na sequência da citação acima, analisa, comparativa e
detalhadamente, cada um dos procedimentos do tipógrafo e do professor,
evidenciando sua nova arte e desejando que ela se instaure quanto antes
em todas as escolas. O professor já não necessita imitar os artesãos,
mas os tipógrafos, que não imitam diretamente a natureza natural, mas a
natureza artificial.
Tanto no modelo da natureza quanto da tipografia, Comênio faz uma
leitura cuidadosa e perspicaz de seu tempo. Percebeu que o bom professor
não se faz em sala de aula com os métodos tradicionais de ensino. O bom
professor é aquele que vive o seu tempo histórico-social, o registra e o
leva para a sala de aula dando-lhe uma forma didática adequada para que
os alunos aprendam de forma sistematizada o conteúdo e o constituam
como parte de resposta aos problemas postos pela sociedade.
O modelo de professor que Comênio nos apresenta é o de um clássico, ou
seja, de alguém que lê o seu tempo, o registra numa determinada
perspectiva pessoal e social e o comunica à sociedade. Assim são os
clássicos da música, da pintura, da escultura, da filosofia, da ciência e
da educação. Comênio é um clássico da educação e da didática. Foi um
revolucionário educacional do século XVII. Por isso imortalizou-se com
suas obras. Elas expressam seu tempo e a ele respondem pedagogicamente.
Os clássicos devem ser lidos e entendidos dentro de seu momento
histórico. A eles é necessário retornar, mesmo que vivamos imersos na
imensidão de obras de grandes pensadores atuais.
Os clássicos nos ensinam a ler o mundo e a registrar de maneira original
sua apreensão. Eles não resolvem nossos problemas, mas nos ensinam a
captar e responder ao nosso momento, com instrumentos e tecnologias de
nossa época. Retornar a Comênio é progredir na educação e na didática.
COMÊNIO - O PAI DA DIDÁTICA
Comênio, pensador tcheco do século XVII, defendeu o ensino de “tudo para todos” e fundamentou um método para ensinar e aprender
"Didática significa arte de ensinar.” Este é o grande e solene
anúncio de Comênio na saudação que faz aos leitores em Didáctica Magna,
um tratado da arte universal de ensinar tudo a todos. Como um pensador
atento a seu tempo, reúne nesta obra sua proposta metodológica que as
escolas deveriam seguir no processo de ensino e de aprendizagem.
Trata-se de uma expressão e uma resposta aos desafios sociais e
educacionais do século XVII, em que se vivia a passagem da Idade Média
para a Idade Moderna. Tudo estava em processo de mudança. Surgiam
gradativamente uma nova forma de trabalho, a ciência, a filosofia, a
literatura e a educação; realizavam-se grandes viagens; novas terras
eram descobertas; tudo se universalizava. Tornava-se necessário que
todas essas conquistas sociais e científicas passassem a ser parte do
conhecimento escolar. Isso somente poderia acontecer se houvesse um
processo pedagógico-didático que fosse do mesmo tamanho dos novos
inventos universais humanos.
Comênio preocupou-se em apresentar os fundamentos sobre os quais se
pudesse edificar um método de ensinar e de aprender com tal segurança
que seria impossível não obter bons resultados. Esse método devia ter um
fundamento tão sólido que conduzisse, com certeza e sem erro, ao
progresso intelectual. As fontes principais desse método eram duas: a
natureza e a tipografia.
A natureza como modelo de ensino
Em Didáctica Magna, Comênio faz um paralelo entre as coisas naturais e
as coisas artificiais para apresentar sua nova arte de ensinar e
aprender. Sobre o fundamento da natureza, como modelo da arte de
ensinar, ele afirma: “Mas, como este fundamento não pode consistir senão
em conformar, com o máximo cuidado possível, as operações desta arte
com as normas que regulam as operações da natureza, [...] perscrutemos
os caminhos da natureza, servindo-nos do exemplo de uma ave que faz sair
dos ovos os seus filhos; e, observando como os jardineiros, os pintores
e os arquitetos seguem felizmente os vestígios da natureza, facilmente
veremos como é que eles devem também ser imitados pelos formadores da
juventude”.
O primeiro fundamento sobre o qual Comênio assenta seu novo modo de
ensinar é o da natureza perfeita. Os que seguirem os passos da natureza
produzirão obras igualmente perfeitas. O modelo adotado é a ave. Como
exemplo dos que seguem o proceder da ave ou da natureza encontram-se os
artesãos: carpinteiros, jardineiros, pintores etc.
Ao eleger a natureza como modelo de sua didática, Comênio expressava seu
tempo e a ele respondia pedagogicamente. Neste período, a ciência da
natureza apresentava um grande desenvolvimento. O homem começava a
passar do teocentrismo para o antropocentrismo, colocando o ser humano
como centro do universo. Ao conhecer a natureza, o homem podia mais
facilmente dominá-la, por isso se tornava senhor dela.
A concepção de natureza que está subjacente na obra de Comênio não é a
natureza em si mesma, mas o conhecimento científico que o homem adquiriu
sobre ela. Portanto, se os artesãos imitavam a natureza é porque haviam
observado e descoberto como ela agia. Por isso, podiam imitar-lhe os
passos em suas novas obras artificiais. Assim, ao tratar dos requisitos
gerais para ensinar e aprender, Comênio apresenta quatro passos:
1º. Mostra o fundamento, segundo o qual a natureza nada faz fora de seu
tempo. Para exemplificar, toma a ave como modelo. Ela, para multiplicar
sua raça, começa a trabalhar na primavera, quando o sol dá vida e vigor a
todos os seres.
2º. Aponta que o procedimento da natureza é imitado pelos artesãos, como
o jardineiro que aguarda a hora certa para o plantio das flores.
3º. Explicita o desrespeito à natureza por aqueles que não seguem seus
passos. Contrariando a natureza e os artesãos, que a imitam em suas
obras, existe a aberração da natureza: os professores. Esses não seguem o
modelo da ave, por isso os resultados de seu trabalho são, em sua
maioria, desastrosos para a aprendizagem. Entre as muitas aberrações
apontadas, apresentamos algumas: os professores não aproveitam o momento
favorável para exercitar as inteligências; não organizam
sequencialmente os exercícios; não se preocupam em preparar
antecipadamente todos os objetos de que necessitam para o ensino; querem
meter na cabeça dos alunos muitas coisas ao mesmo tempo; exigem que os
alunos decorem as lições sem tê-las compreendido; obrigam as crianças a
aprender pela força; constrangem as inteligências quando obrigam as
crianças a fazer coisas superiores à sua idade ou à sua capacidade.
4º. Apresenta a correção para cada uma das aberrações assinaladas,
mostrando como os professores devem imitar os artesãos, que, por sua
vez, imitam a natureza que é perfeita. É uma tríplice correção: que a
formação deve iniciar-se na primavera da vida, isto é, na puerícia; as
horas da manhã são mais propícias para os estudos; tudo deve dispor-se
segundo a idade, para que as crianças aprendam apenas aquilo que são
capazes de entender.
A tipografia como modelo de ensino
Se, num primeiro momento, Comênio elege a natureza, numa segunda fase o
centro de processo escolar passa a ser a imprensa. Assim se expressa:
“Desejamos que o método de ensinar atinja tal perfeição que, entre a
forma habitualmente usada até hoje e a nossa nova forma, apareça
claramente que vai a diferença que vemos entre a arte de multiplicar os
livros, copiando-os à pena, como era uso antigamente, e a arte da
imprensa, que depois foi descoberta e agora é usada”.
Como a arte tipográfica é mais adequada para escrever livros com
rapidez, precisão e elegância, assim também o novo método servirá para
ensinar a um maior número de alunos com maior proveito e prazer. Comênio
mostra todas as vantagens que a imprensa tem sobre a arte dos copistas,
a tal ponto que deseja até mudar o nome da didática para didacografia.
O pensador compara a arte da tipografia, quanto aos materiais que
utiliza e os trabalhos que são necessários para operar o novo invento,
com o novo método didático. Assim, na tipografia os materiais são:
papel, tipos, tinta, prelo; os trabalhos: preparação do papel,
composição, paginação, colocar tinta nos tipos, a tiragem das folhas
etc. Os procedimentos da tipografia e da nova didática são os mesmos:
“Na didacografia (agrada-me usar esta palavra), as coisas se passam
precisamente da mesma maneira. O papel são os alunos, em cujos espíritos
devem ser impressos os caracteres das ciências. Os tipos são os livros
didáticos e todos os outros instrumentos propositadamente preparados
para que, com a sua ajuda, as coisas a aprender se imprimam nas mentes
com pouca fadiga. A tinta é a viva-voz do professor que transfere o
significado das coisas, dos livros para as mentes dos alunos. O prelo é a
disciplina escolar que a todos dispõe e impele para se embeberem dos
ensinamentos”.
Comênio, na sequência da citação acima, analisa, comparativa e
detalhadamente, cada um dos procedimentos do tipógrafo e do professor,
evidenciando sua nova arte e desejando que ela se instaure quanto antes
em todas as escolas. O professor já não necessita imitar os artesãos,
mas os tipógrafos, que não imitam diretamente a natureza natural, mas a
natureza artificial.
Tanto no modelo da natureza quanto da tipografia, Comênio faz uma
leitura cuidadosa e perspicaz de seu tempo. Percebeu que o bom professor
não se faz em sala de aula com os métodos tradicionais de ensino. O bom
professor é aquele que vive o seu tempo histórico-social, o registra e o
leva para a sala de aula dando-lhe uma forma didática adequada para que
os alunos aprendam de forma sistematizada o conteúdo e o constituam
como parte de resposta aos problemas postos pela sociedade.
O modelo de professor que Comênio nos apresenta é o de um clássico, ou
seja, de alguém que lê o seu tempo, o registra numa determinada
perspectiva pessoal e social e o comunica à sociedade. Assim são os
clássicos da música, da pintura, da escultura, da filosofia, da ciência e
da educação. Comênio é um clássico da educação e da didática. Foi um
revolucionário educacional do século XVII. Por isso imortalizou-se com
suas obras. Elas expressam seu tempo e a ele respondem pedagogicamente.
Os clássicos devem ser lidos e entendidos dentro de seu momento
histórico. A eles é necessário retornar, mesmo que vivamos imersos na
imensidão de obras de grandes pensadores atuais.
Os clássicos nos ensinam a ler o mundo e a registrar de maneira original
sua apreensão. Eles não resolvem nossos problemas, mas nos ensinam a
captar e responder ao nosso momento, com instrumentos e tecnologias de
nossa época. Retornar a Comênio é progredir na educação e na didática.
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