A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR NA INFÂNCIA
Estudos, pesquisas e livros são boas fontes não só para compreender a relevância do brincar como também para proporcioná-lo às crianças. Mergulhe fundo neles!
Brincar é importante para os pequenos e disso você tem certeza. Mas por
quê? Sem essa resposta, fica difícil desenvolver um bom trabalho com as
turmas de creche e de pré-escola, não é mesmo? Se essa inquietação faz
parte do seu dia a dia, sinta-se convidado a estudar o tema. Ele rende
pano para manga desde muito, muito tempo atrás. "Os primeiros
questionamentos sobre o brincar não estavam relacionados a jogos,
brinquedos e brincadeiras, mas focavam a cultura", diz Clélia Cortez,
formadora do Instituto Avisa Lá, em São Paulo.
No fim do século 19, o psicólogo e filósofo francês Henri Wallon (1879-1962), o biólogo suíço Jean Piaget (1896-1980) e o psicólogo bielo-russo Lev Vygotsky
(1896-1934) buscavam compreender como os pequenos se relacionavam com o
mundo e como produziam cultura. Até então, a concepção dominante era de
que eles não faziam isso. "Investigando essa faceta do universo
infantil, eles concluíram que boa parte da comunicação das crianças com o
ambiente se dá por meio da brincadeira e que é dessa maneira que elas
se expressam culturalmente", explica Clélia.
Wallon foi o primeiro a quebrar os paradigmas da época ao dizer que a
aprendizagem não depende apenas do ensino de conteúdos: para que ela
ocorra, são necessários afeto e movimento também. Ele afirmava que é
preciso ficar atento aos interesses dos pequenos e deixá-los se deslocar
livremente para que façam descobertas. Levando em conta que as escolas
davam muita importância à inteligência e ao desempenho, propôs que
considerassem o ser humano de modo integral. Isso significa introduzir
na rotina atividades diversificadas, como jogos. Preocupado com o
caráter utilitarista do ensino, Wallon pontuou que a diversão deve ter
fins em si mesma, possibilitando às crianças o despertar de capacidades,
como a articulação com os colegas, sem preocupações didáticas.
Já Piaget, focado no que os pequenos pensam sobre tempo, espaço e
movimento, estudou como diferem as características do brincar de acordo
com as faixas etárias. Ele descobriu que, enquanto os menores fazem
descobertas com experimentações e atividades repetitivas, os maiores
lidam com o desafio de compreender o outro e traçar regras comuns para
as brincadeiras.
As pesquisas de Vygotsky apontaram que a produção de cultura depende de
processos interpessoais. Ou seja, não cabe apenas ao desenvolvimento de
um indivíduo, mas às relações dentro de um grupo. Por isso, destacou a
importância do professor como mediador e responsável por ampliar o
repertório cultural das crianças. Consciente de que elas se comunicam
pelo brincar, Vygotsky considerou uma intervenção positiva a
apresentação de novas brincadeiras e de instrumentos para enriquecê-las.
Ele afirmava que um importante papel da escola é desenvolver a
autonomia da turma. E, para ele, esse processo depende de intervenções
que coloquem elementos desafiadores nas atividades, possibilitando aos
pequenos desenvolver essa habilidade.
Jogar define a organização da cultura humana
Mais focado na questão do brincar com jogos, o filósofo e historiador
holandês Johan Huizinga (1872-1975) se dedicou a observar os aspectos do
tema no que diz respeito não só ao universo infantil. Ele se debruçou
sobre a questão envolvendo a produção cultural de forma geral, chegando a
propor que a nomenclatura Homo ludens fosse usada para distinguir os
humanos de outras espécies, como Homo sapiens e Homo faber.
A razão, de acordo com ele, é a seguinte: os jogos fazem parte de todas
as fases da vida e estão na base do surgimento e do desenvolvimento da
civilização, a ponto de definir a organização cultural das sociedades.
Seus mecanismos e suas estruturas estão na essência, por exemplo, de
guerras e leis. Com base em levantamentos históricos, Huizinga apontou
que ambas têm características semelhantes às encontradas no
funcionamento dos jogos. Há espaços definidos para as jogadas - o campo
de batalha e o tribunal, respectivamente - e os adversários competem de
acordo com regras no intuito de evitar arbitrariedades.
O pensamento infantil ainda desafia os pesquisadores Se com os
resultados das pesquisas realizadas entre os séculos 19 e 20, várias
questões sobre o brincar foram respondidas, ainda existem muitas sem
respostas. Hoje, diversos pesquisadores continuam se dedicando ao tema
levando em consideração o que Wallon e seus contemporâneos descobriram.
O filósofo francês Gilles Brougère, por exemplo, se dedica a pesquisar
os brinquedos e a relação das crianças com eles em diferentes contextos
desde a década de 1970. Ele defende que, mesmo fazendo parte da essência
do ser humano, a brincadeira precisa de um contexto social para
ocorrer. Com base nessa concepção, define o objeto como algo simbólico e
que só tem caráter funcional quando os pequenos o utilizam em
brincadeiras. Ao levar em conta esse aspecto, Brougère considera que a
intervenção do educador deve ocorrer para socializar as diferentes
maneiras de brincar da turma, com conversas e registros.
No Brasil, núcleos de pesquisas também se dedicam ao tema. É o caso do
Grupo de Estudo e Pesquisa em Psicopedagogia (Gepesp) da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), do qual faz parte Rosely Brenelli,
doutora em Psicopedagogia. Desde a década de 1980, ela se dedica a
pesquisar jogos de regra e sua influência nas interações sociais,
focando o ambiente escolar.
O estudo teve como ponto de partida a observação de crianças com
dificuldades de aprendizagem para entender como as necessidades delas
podem ser supridas com jogos. "Eles surgiram como uma alternativa para o
ensino de alguns conteúdos. Mas era necessário entender por que isso
ocorria e em que medida seria útil na sala de aula", diz. A pesquisa
abordou como as intervenções do educador afetam a construção do
raciocínio de uma criança durante o jogo. "Analisamos em que medida isso
deve ocorrer para que ela construa suas habilidades."
Outra brasileira que estuda o brincar é Renata Meirelles, mestre em
Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Com o objetivo de
conhecer e divulgar o amplo repertório de jogos, brinquedos e
brincadeiras do Brasil, ela se voltou às práticas externas à escola.
"Descobri modalidades e variações interessantes a serem exploradas", diz
ela.
Além desses estudiosos, existem outros empenhados em desvendar as
questões que envolvem jogos, brinquedos e brincadeiras, a relação deles
com os pequenos, com a Educação e com você também. Vale a pena conhecer
mais a fundo as pesquisas para enriquecer as experiências da turma.
Fonte: Revista Nova Escola
A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR NA INFÂNCIA
Estudos, pesquisas e livros são boas fontes não só para compreender a relevância do brincar como também para proporcioná-lo às crianças. Mergulhe fundo neles!
Brincar é importante para os pequenos e disso você tem certeza. Mas por
quê? Sem essa resposta, fica difícil desenvolver um bom trabalho com as
turmas de creche e de pré-escola, não é mesmo? Se essa inquietação faz
parte do seu dia a dia, sinta-se convidado a estudar o tema. Ele rende
pano para manga desde muito, muito tempo atrás. "Os primeiros
questionamentos sobre o brincar não estavam relacionados a jogos,
brinquedos e brincadeiras, mas focavam a cultura", diz Clélia Cortez,
formadora do Instituto Avisa Lá, em São Paulo.
No fim do século 19, o psicólogo e filósofo francês Henri Wallon (1879-1962), o biólogo suíço Jean Piaget (1896-1980) e o psicólogo bielo-russo Lev Vygotsky
(1896-1934) buscavam compreender como os pequenos se relacionavam com o
mundo e como produziam cultura. Até então, a concepção dominante era de
que eles não faziam isso. "Investigando essa faceta do universo
infantil, eles concluíram que boa parte da comunicação das crianças com o
ambiente se dá por meio da brincadeira e que é dessa maneira que elas
se expressam culturalmente", explica Clélia.
Wallon foi o primeiro a quebrar os paradigmas da época ao dizer que a
aprendizagem não depende apenas do ensino de conteúdos: para que ela
ocorra, são necessários afeto e movimento também. Ele afirmava que é
preciso ficar atento aos interesses dos pequenos e deixá-los se deslocar
livremente para que façam descobertas. Levando em conta que as escolas
davam muita importância à inteligência e ao desempenho, propôs que
considerassem o ser humano de modo integral. Isso significa introduzir
na rotina atividades diversificadas, como jogos. Preocupado com o
caráter utilitarista do ensino, Wallon pontuou que a diversão deve ter
fins em si mesma, possibilitando às crianças o despertar de capacidades,
como a articulação com os colegas, sem preocupações didáticas.
Já Piaget, focado no que os pequenos pensam sobre tempo, espaço e
movimento, estudou como diferem as características do brincar de acordo
com as faixas etárias. Ele descobriu que, enquanto os menores fazem
descobertas com experimentações e atividades repetitivas, os maiores
lidam com o desafio de compreender o outro e traçar regras comuns para
as brincadeiras.
As pesquisas de Vygotsky apontaram que a produção de cultura depende de
processos interpessoais. Ou seja, não cabe apenas ao desenvolvimento de
um indivíduo, mas às relações dentro de um grupo. Por isso, destacou a
importância do professor como mediador e responsável por ampliar o
repertório cultural das crianças. Consciente de que elas se comunicam
pelo brincar, Vygotsky considerou uma intervenção positiva a
apresentação de novas brincadeiras e de instrumentos para enriquecê-las.
Ele afirmava que um importante papel da escola é desenvolver a
autonomia da turma. E, para ele, esse processo depende de intervenções
que coloquem elementos desafiadores nas atividades, possibilitando aos
pequenos desenvolver essa habilidade.
Jogar define a organização da cultura humana
Mais focado na questão do brincar com jogos, o filósofo e historiador
holandês Johan Huizinga (1872-1975) se dedicou a observar os aspectos do
tema no que diz respeito não só ao universo infantil. Ele se debruçou
sobre a questão envolvendo a produção cultural de forma geral, chegando a
propor que a nomenclatura Homo ludens fosse usada para distinguir os
humanos de outras espécies, como Homo sapiens e Homo faber.
A razão, de acordo com ele, é a seguinte: os jogos fazem parte de todas
as fases da vida e estão na base do surgimento e do desenvolvimento da
civilização, a ponto de definir a organização cultural das sociedades.
Seus mecanismos e suas estruturas estão na essência, por exemplo, de
guerras e leis. Com base em levantamentos históricos, Huizinga apontou
que ambas têm características semelhantes às encontradas no
funcionamento dos jogos. Há espaços definidos para as jogadas - o campo
de batalha e o tribunal, respectivamente - e os adversários competem de
acordo com regras no intuito de evitar arbitrariedades.
O pensamento infantil ainda desafia os pesquisadores Se com os
resultados das pesquisas realizadas entre os séculos 19 e 20, várias
questões sobre o brincar foram respondidas, ainda existem muitas sem
respostas. Hoje, diversos pesquisadores continuam se dedicando ao tema
levando em consideração o que Wallon e seus contemporâneos descobriram.
O filósofo francês Gilles Brougère, por exemplo, se dedica a pesquisar
os brinquedos e a relação das crianças com eles em diferentes contextos
desde a década de 1970. Ele defende que, mesmo fazendo parte da essência
do ser humano, a brincadeira precisa de um contexto social para
ocorrer. Com base nessa concepção, define o objeto como algo simbólico e
que só tem caráter funcional quando os pequenos o utilizam em
brincadeiras. Ao levar em conta esse aspecto, Brougère considera que a
intervenção do educador deve ocorrer para socializar as diferentes
maneiras de brincar da turma, com conversas e registros.
No Brasil, núcleos de pesquisas também se dedicam ao tema. É o caso do
Grupo de Estudo e Pesquisa em Psicopedagogia (Gepesp) da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), do qual faz parte Rosely Brenelli,
doutora em Psicopedagogia. Desde a década de 1980, ela se dedica a
pesquisar jogos de regra e sua influência nas interações sociais,
focando o ambiente escolar.
O estudo teve como ponto de partida a observação de crianças com
dificuldades de aprendizagem para entender como as necessidades delas
podem ser supridas com jogos. "Eles surgiram como uma alternativa para o
ensino de alguns conteúdos. Mas era necessário entender por que isso
ocorria e em que medida seria útil na sala de aula", diz. A pesquisa
abordou como as intervenções do educador afetam a construção do
raciocínio de uma criança durante o jogo. "Analisamos em que medida isso
deve ocorrer para que ela construa suas habilidades."
Outra brasileira que estuda o brincar é Renata Meirelles, mestre em
Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Com o objetivo de
conhecer e divulgar o amplo repertório de jogos, brinquedos e
brincadeiras do Brasil, ela se voltou às práticas externas à escola.
"Descobri modalidades e variações interessantes a serem exploradas", diz
ela.
Além desses estudiosos, existem outros empenhados em desvendar as
questões que envolvem jogos, brinquedos e brincadeiras, a relação deles
com os pequenos, com a Educação e com você também. Vale a pena conhecer
mais a fundo as pesquisas para enriquecer as experiências da turma.
Fonte: Revista Nova Escola
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